Certa vez, João da Silva trancou-se no banheiro e prometeu nunca mais sair dali, depois de uma briga com Maria da Silva sobre uma meia jogada detrás da porta.
Ao invés de tomar alguma medida a família concordou com a loucura dele, pois João estava mesmo insuportável nos últimos tempos.
Depois da briga, ele entrou no banheiro e se viu no reflexo da hydra. A sua imagem deformada, naquele botão armado sobre um bojo metálico, o levou a decidir ficar mesmo dentro daquele banheiro pro resto da vida. Era melhor do que viver a estúpidez do mundo lá fora, achava ele.
A família passava a comida e outras necessidades pela janela.
João meditava, alimentava-se e tomava banho. Puro, limpo e sem incomodar ninguém.
Ali, ele construiu seu mundo, entre os azulejos e os sanitários.
Um dia masturbando-se no ladrilho, engravidou o box do chuveiro. Desiludiu-se quando dos ladrilhos, nasceram ladrões.
A partir de então decidiu nunca mais nunca mais entregar-se ao amor, mas sim à filosofia. Um dia pediu ao filho, pela janela, pra comprar-lhe o livro O PEQUENO PRÍNCIPE.
Até que um dia, tomando água na boca da torneira, perdeu-se num beijo e apaixonou-se por ela.
A família construiu outro banheiro num puxado atrás do quintal e com a aposentadoria de João compraram um fusca 74 novinho, que aquela era a época de fuscas 74.